quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

FAZ HOJE 30 ANOS QUE...


Imagem daqui

Dia 06 de Janeiro de 1980. No aeroporto da Portela, já dentro do avião, um Boeing 707, junto à janela, naqueles instantes em que o avião permanece na pista aguardando a ordem para levantar, abstraí-me dos companheiros de viagem e dos Comissários de bordo e das suas explicações de segurança, olhei pela janela e recordei-me dos meus 10 anos, em 1970, quando aqui aterrei pela primeira vez, a bordo dum destes Boeing 707, vindo de Moçambique. Na altura, eu era  uma criança europeia habituada à realidade africana e observando pela janela a mesma cena que agora vislumbrava, mas na minha ingenuidade infantil, atónito, agarrei o pulso da minha Mãe, enquanto lá fora, pachorrentamente um grupo de homens, de enxada em punho, cortava a erva entre as pistas – Mãe, Mãe! Olha! Ó Mãe, os pretos aqui são brancos!-- Nisto já o avião levantara voo. Lá ia eu num voo internacional, com destino à América, com escala em Santa Maria, o meu próximo destino. Apesar de novito, já conhecia muitas da possessões ultramarinas, as Ilhas da Madeira, Cabo Verde, S. Tomé, Angola, Durban na África do Sul e claro, Moçambique onde fui parido. Isto, graças às viagens no navio Príncipe Perfeito, da Metrópole para Moçambique, 29 dias de viagem, memoráveis, que um dia contarei aos meus netos. Ainda me faltava conhecer os Açores, e quis o destino que em breve aterrasse numa dessas Ilhas de bruma.
Duas horas e pouco depois, lá estava eu em solo açoriano, era fim de tarde, princípio de noite, o nervoso miudinho voltou.
Já de mala na mão, fui ao balcão da SATA, saber do meu voo e das alternativas, afinal eram quase 19 horas, o voo estava marcado para a manhã do dia seguinte e se houvesse uma oportunidade de viajar ainda naquele dia... mas infelizmente já não podia ser, já não havia mais voos. Quando não há remédio, remediado está! Fome não tinha, na TAP, naquele tempo, a comida era muito boa, e eu fiz pela vida, já estava pago e eu não sabia o que me esperava. O problema era um ligeiro cansaço, não dormi no combóio e precisava de arranjar um lugar para descansar o esqueleto. Indicaram-me um hotel perto do aeroporto, o único, ou em alternativa umas residenciais na Vila, mas ficava longe e era por tão poucas horas, resolvi só tentar o hotel.
E lá fui, recordo-me da noite escura, escuro como breu, mas 300 metros mais abaixo, lá estavam as luzes do hotel, não me recordo do nome, só da simpatia dos recepcionistas que me informaram que o hotel estava praticamente lotado, só haviam 2 quartos livres. Imaginei que eram os melhorzinhos porque pelo preço, dos 6 contos que levava na carteira, ficava quase liso, declinei a oferta! Outra vez, quando não há remédio, remediado está! Jaquim, Jaquim, a coisa está a complicar-se! Voltei para a sala de espera do aeroporto. O meu voo saía às 07:40 horas do dia seguinte. Mais uma noite ao relento! Mas, mesmo assim, agarrado à mala, num banco de plástico rijo, um olho aberto, o outro fechado, ia dormitando cada metade do corpo. As pessoas dali falavam português, mas eu estava em terra estranha, nada de confiar! Nunca as horas me custaram tanto a passar, fartei-me de dar corda ao relógio, mas nem assim!

Faz hoje 30 anos que... continua.

5 comentários:

Joaquim Leça disse...

Marques,

É engraçado ver como a tua história tem algumas semelhanças com a minha própria história no DCA. Com um pequeno (e óbvio) pormenor. Na minha não há comboios!
Continua, pois, que a malta está a gostar!
Abraço!

Cláudia disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Cláudia disse...

A minha começou também de comboio, pois meu pai também é ferroviário.Estou a gostar muito.

Joaquim Marques AC disse...

Leça e Cláudia,
Muito obrigado pelas palavras de incentivo.

Graciete disse...

Marques,
Estou a adorar esta tua novela!
É sem dúvida, uma história muito bem enquadrada no tempo, cujos detalhes tocam quem vivenciou estes anos e outros mais alargados no tempo.
Lembro-me que 6 contos nesta altura, davam para muito.

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